Você Retém O Bem De Tudo Que Vê?

Tempo Estimado de Leitura: 10 min

“FOOTLOOSE – RITMO LOUCO”, lançado em 1984, é um dos filmes mais icônicos dos anos 80 e se você não assistiu é importante ressaltar que o texto a seguir está repleto de SPOILERS!
No filme, um jovem chamado Ren McCormack (Kevin Bacon) se muda com sua mãe, Ethel (Frances Lee McCain), da cidade de Chicago para uma pequena comunidade chamada Bomont — onde o estilo de vida é bem mais conservador e pacato do que na metrópole — e conhece a família do Pr. Shaw Moore (John Lithgow), acabando por se afeiçoar à filha deste, Ariel (Lori Singer).

A esposa de Shaw, Vi (Dianne Wiest) é uma pessoa cordial e gentil, mas não podemos dizer o mesmo de seu marido: Shaw é um homem severo, extremamente intransigente e que tem uma influência tão grande sobre a comunidade local que sua autoridade jamais é questionada por ninguém, nem mesmo no meio secular.
Sua palavra é lei e uma das restrições na legislação da comunidade diz respeito à dança: qualquer baile ou festa que inclua esse ato é algo estritamente proibido nos limites do município e todas as tentativas de se flexibilizar essa lei sempre são barradas por Shaw, que determina como os legisladores locais devem votar em cada tentativa de mudança.

Ren, que não aceita tal interferência de Shaw na vida particular dos moradores, rebela-se contra essa lei por considerá-la abusiva e isso acaba por custar-lhe até o emprego, além de ameaças cada vez mais ostensivas, como quando sua janela é quebrada por um tijolo com a inscrição “Queime no Inferno”.
Shaw, que obviamente não simpatiza nem um pouco com Ren, proíbe Ariel de vê-lo, mas ela eventualmente revela a Ren o motivo de seu pai ser uma pessoa tão intratável e controladora, especialmente em relação à dança: cinco anos antes, seu irmão Bobby morrera em um acidente de trânsito ao voltar de um baile e Shaw, abalado pela perda do filho, decidiu fazer o que fosse preciso para proibir a dança no local.

Isso impediria que os jovens moradores, que estavam terminando o ensino médio, pudessem realizar um baile de formatura, e Ren, auxiliado por Ariel, mostra, no dia de mais uma votação contra essa lei, várias passagens bíblicas onde a dança não só é permitida, mas até incentivada, mas não obtém sucesso.
Após a tentativa frustrada, um morador revela a Ren que é perda de tempo tentar mudar essa lei, porque Shaw sempre vai a tais reuniões com a votação já totalmente acertada com os legisladores.

No entanto, as consequências da mão de ferro com que Shaw trata a comunidade começam a aparecer: o pregador encontra vários membros de sua igreja retirando livros da biblioteca pública local e queimando-os diante dos olhos de todos, por considerá-los prejudiciais para os jovens, e ainda tem de encarar o choque de sua filha lhe revelar que não é mais virgem.
Transtornado, vendo que seu cuidado sufocante com a comunidade teve o efeito inverso ao que pretendia, Shaw conversa com sua esposa e ela lhe diz que ele não pode querer ser responsável pela vida de todos e determinar o que é ou não certo em suas vidas pessoais, e que essa sua postura é o que faz ele não conseguir sequer ser um bom pai para Ariel, daí a rebeldia de sua filha.
Ela conclui dizendo que Shaw é um ótimo pregador, capaz de fazer a congregação sentir o paraíso ao ouvi-lo, mas que ele é muito falho ao lidar com o ser humano.

Por fim, Shaw, mesmo que ainda não tenha dito para os legisladores liberarem a dança no município, autoriza todos os jovens a celebrar sua formatura de ensino médio no município vizinho — incluindo Ariel— e segue-se a clássica cena final do filme, com as danças extravagantes e energéticas dos protagonistas no baile de formatura, ao som de “Footloose”, do roqueiro Kenny Loggins, que dá nome ao filme.

A intenção deste texto não é avaliar o filme em si, e nem mesmo levar em conta a fé (ou sua ausência) nos atores que nele aparecem: nada tendo a ver com os personagens de perfil cristão que interpretaram, é sabido, por exemplo, que Kevin Bacon é ateu, Lori Singer é judia e John Lithgow, agnóstico.
Existem, no entanto, duas lições bem importantes neste filme, que podem ser muito úteis à vida de testemunho do cristão, ambas ensinando, na verdade, coisas a serem evitadas.

A primeira LIÇÃO

É o fato de que não cabe ao cristão, enquanto testemunha do nome de Jesus, agir como “supervisor” da vida daqueles a quem testemunha ou que eventualmente seja convertido por seu intermédio.
O que lhe compete é dar orientação, ensinar o que é ser cristão, os princípios que norteiam a vida de um filho de Deus e quais frutos Deus espera encontrar nas vidas daqueles que o seguem, frutos esses citados por Paulo.
Tanto os da carne, que o cristão deve evitar:

Ora, as obras da carne são manifestas:
imoralidade sexual, impureza e libertinagem;
idolatrias e feitiçarias;
ódio, discórdia, ciúmes, ira, egoísmo, dissensões, facções e inveja;
embriaguez, orgias e tudo quanto se pareça com essas perversidades, contra as quais vos advirto, como já vos preveni antes: os que as praticam não herdarão o Reino de Deus!

(Gálatas 5:19-21 – KJA)

Assim como também os que deve buscar:

Entretanto, o fruto do Espírito é:
amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio.
Contra essas virtudes não há Lei.

(Gálatas 5:22-23 – KJA)

O cristão não deve jamais moldar o Evangelho “ao gosto do freguês”, porque não existe Evangelho que se adapte à natureza humana, decaída em pecado!
Tudo deve ser colocado de forma clara, mostrando que viver o Evangelho não é tarefa fácil e envolve, como disse Jesus, “negar a si mesmo e carregar a sua cruz” (vide Mateus 16:24), renunciando aos próprios desejos e vivendo para fazer a vontade de Deus.

Porém, isso tampouco implica em que o cristão deva estar fiscalizando a vida alheia porque, tal como no filme, isso nunca leva a bom termo, mas a uma escolha entre dois resultados, ambos péssimos: à submissão servil, mais pelo temor da punição do que pelo amor a Cristo (tal como na comunidade retratada no filme), ou à rebeldia contra o próprio Deus (caso da filha de Shaw no filme, Ariel).
Um exemplo bíblico de alguém que entendeu o seu papel como testemunha do nome de Deus, mesmo que ainda no Antigo Testamento, é

o profeta Eliseu

Quando Naamã lhe foi enviado para curar sua lepra, mesmo após ter, a princípio, duvidado se mergulhar sete vezes no Jordão realmente teria qualquer efeito, o sírio acabou por ficar tão agradecido por ter recebido a cura pela qual tanto ansiava que quis presentear o profeta, mas este não aceitou.
E aí segue-se um ponto que se encaixa perfeitamente nesta reflexão: Naamã, por seus deveres diplomáticos e estatais, teria de se prostrar diante do ídolo Rimom da Síria, mas entendia que isso era algo que não agradaria ao Deus verdadeiro, o qual o curara e ao qual desejaria servir daquele momento em diante, por isso pedia que Deus o perdoasse por isso:

Nisto perdoe o SENHOR a teu servo; quando meu senhor entrar na casa de Rimom para ali adorar, e ele se encostar na minha mão, e eu também tenha de me encurvar na casa de Rimom;
quando assim me encurvar na casa de Rimom, nisto perdoe o SENHOR a teu servo.
E ele lhe disse:
Vai em paz. E foi dele a uma pequena distância.

(2 Reis 5:18-19 – ACF)

É impressionante como Eliseu não o encheu de discursos sobre o pecado, estabelecendo normas para Naamã seguir, ou o ameaçando com a ira divina: sua resposta foi simplesmente “vai em paz”.
Eliseu compreendia que Naamã ainda era iniciante na sua caminhada com o Deus verdadeiro e, portanto, era de se esperar que ainda não fosse possuidor daquela fé heroica, que resiste a qualquer adversidade e supera todos os obstáculos.
Eliseu entendia que seu papel estava cumprido, tendo trazido mais um filho de Deus de volta ao Pai, e que dali em diante a própria experiência que Naamã teria com o Criador preencheria gradualmente as lacunas que sua fé ainda carregava.

E será que Naamã foi salvo?
Tudo indica que sim, pois Jesus o citou como um exemplo da misericórdia divina:

Assim também, no tempo do profeta Eliseu, havia muitos leprosos em Israel, mas nenhum deles foi purificado, a não ser Naamã, o sírio.

(Lucas 4:27 – KJA)

Assim, tal como o semeador da parábola de Lucas 8:5-15, ao cristão compete apenas semear a Palavra, não a fazer crescer e prosperar, nem determinar o que ela fará na vida de quem a recebe, quais frutos dará: isso é o trabalho do Espírito Santo, e de ninguém mais!

A segunda lição

Footloose também nos permite apreender uma outra prática jamais autorizada pela Palavra, mas que muitos costumam adotar em seu testemunho: fazer de sua experiência pessoal a base para formulação de doutrinas a serem seguidas por todos!
O Pr. Shaw Moore agiu dessa forma: pensando estar fazendo um bem a todos ao proibir a dança na comunidade local — crendo que assim estaria fazendo a vontade de Deus e evitando novas tragédias — tudo o que conseguiu foi formar uma horda de fanáticos ao redor de seu próprio nome (e não ao nome de Cristo), fanáticos esses que já começavam a ficar fora de controle, rejeitando qualquer pensamento diferente e passando a ver a si mesmos como juízes e carrascos, e não como testemunhas de Jesus.

Há algum tempo, ocorreu um episódio que ilustra bem essa questão de basear doutrinas em experiências pessoais.
A conhecida pastora Sarah Sheeva, que já foi cantora secular, declarou que o cristão não deve jamais ouvir música “do mundo”, ou seja, não-cristã, e que apenas o gênero Gospel é adequado a um filho de Deus.
Segundo ela, o meio musical é sujo, repleto de vaidades e onde as pessoas passam umas por cima das outras, além das letras que em nada edificam a fé.

Não se pode negar que o que ela disse é verdade, especialmente porque cresceu nesse meio, porém, não é mistério para ninguém que o meio da música Gospel pouco se difere disso atualmente, com a possível exceção de que há letras que podem ajudar edificar a fé do cristão que as ouve.
No entanto, muitos dos cantores gospel não vivem o que cantam e suas vidas em nada se diferem das de pessoas mundanas, a não ser no discurso.
Vários deles são conhecidos por seus rompantes de estrelismo, suas exigências por cachês exorbitantes e tratamento VIP para se apresentarem, mesmo em igrejas com poucos recursos financeiros (estas, obviamente, em geral são descartadas por eles e/ou seus empresários para apresentações).

O Pr. Anderson Silva, na ocasião, respondeu a Sarah Sheeva com uma crítica bem incisiva, dizendo que ela tem o direito de determinar tal restrição para a sua própria vida, mas isso não a autoriza a usar a sua experiência para dizer o que deve ou não ser seguido pelo restante da cristandade.
De fato, ao escrever a primeira Epístola aos Coríntios o apóstolo Paulo afirma tal conceito ao falar sobre a liberdade cristã: ele trata, entre outras coisas, da questão da carne sacrificada a ídolos.
Essa era uma prática corrente no mundo pagão da Grécia antiga, em que uma parte da carne dos animais imolados nos sacrifícios aos ídolos locais era reservada para posterior comercialização e, dessa forma, a maior parte das carnes encontradas no comércio local tinham tal origem, o que levantou a questão sobre se era ou não lícito ao cristão comê-las.

Paulo é bem claro ao dizer que não há nada de errado em comer essas carnes (afinal, ídolos nada mais são do que paus e pedras moldados e enfeitados), mas que se deve evitar fazê-lo caso isso possa causar desconforto em quem esteja perto e ainda não seja maduro o suficiente na fé para entender esse conceito (vide 1 Coríntios 10:28,29).

Porém, como a passagem deixa claro, isso é por respeito à consciência de alguém ainda fraco na fé, não uma doutrina.
O cristão tem a liberdade de fazer tudo o que a palavra não o proíbe, mas sempre levando em conta, como diz o versículo 23, “que tudo é lícito, mas nem tudo convém”.
Porém, em circunstâncias em que está envolvida uma confissão da verdade do Evangelho, o cristão tem de ser firme e não ceder: Paulo circuncidou a Timóteo quando o levou consigo em uma viagem missionária, a fim de não haver resistência à pregação por parte dos judeus (veja Atos 16:3), mas quando judaizantes já instruídos no Evangelho insistiram que o mesmo deveria ser feito a Tito, ele recusou-se terminantemente a submeter-se, ou a seu amigo, a tal arbitrariedade (vide Gálatas 2:1-5).

Assim, cada cristão tem de entender que pode e deve agir de acordo com sua consciência, sempre subordinada à palavra de Deus, mas que não tem autoridade para fazer de suas experiências ou de suas interpretações pessoais, regras e normas para os outros, coisas que a Bíblia não determina que os demais cristãos devem seguir.
Como diz o próprio Paulo:

Examinai tudo. Retende o bem.

(1 Tessalonicenses 5:21 – ACF)

Mesmo de um filme nos é possível obter aprendizado para a vida cristã.
É óbvio que um cristão não deverá ser um rebelde contra imposições e tiranias a ponto de rebelar-se contra o próprio Deus (tal como fez Ariel, mantendo relações sexuais sem ser casada, apenas para desafiar seu autoritário pai), mas há coisas que, devidamente “filtradas” pela Palavra, podem ser úteis mesmo nos lugares mais improváveis.

Nos Laços do Calvário

TÍTULO ORIGINAL: APRENDENDO COM “FOOTLOOSE”

É curioso perceber como até de alguns filmes seculares de tempos passados é possível extrair boas lições, enquanto que a maioria das produções atuais dão sempre um jeito de tentar moldar a percepção das massas contra Deus e normalizar Satanás.
Isso é apenas mais um indício de que os tempos finais estão se configurando muito rapidamente e, antes que o Senhor volte como um ladrão na noite, é necessário que o profetizado reinado do anticristo se consolide não apenas no Brasil, mas por todo o mundo!
Na fase 2023 d’O Pior evangelho decidi lançar mão de novos formatos na expectativa auxiliar a aumentar o alcance dos conteúdos relacionados às Escrituras — stories, vídeos, textos mais curtos, autores convidados… — e essa publicação, onde tomei a liberdade de realizar revisão e ilustração, é parte desse projeto.
Obrigado por ter lido até aqui.
Continuo necessitando de toda colaboração possível: comentários, compartilhamentos e reações ajudam a divulgar este conteúdo que foi integralmente produzido na intenção de colaborar para a edificação do Corpo de Cristo no mundo.

Tenho vergonha de pedir.
Odeio incomodar os leitores e passei o ano de 2023 inteiro apenas publicando comentários, como os acima, em letras castanhas sem qualquer pretensão de ser incisivo em meus pedidos. Fiz isso porque ainda depositava uma pequena parcela de credibilidade na justiça e aguardava que ela, diante de minha incontestável deficiência, intimasse a seguradora a honrar o seguro funcional que me vendeu.
Só que deu tudo errado e nem os mais altos graus dos juízes deste país recusam suborno!

De súbito, fui lançado numa situação de extrema necessidade financeira e tanto os links imediatamente acima quanto o vídeo ao lado podem esclarecer o nível de desespero que me acomete e me traz a publicar esse apelo ao final da maioria de minhas publicações.

Peço perdão pelo incômodo, mas peço que, por favor, assista e ajude não apenas a manter esse site, mas também o próprio editor e sua família, com vida e saúde: eu realmente sentiria muita vergonha de expor tudo isso se não fosse a mais pura realidade.

Colabore via Paypal:
https://www.paypal.com/donate/?hosted_button_id=HAHGBQDAEUTCJ

Colabore com um PIX:

Agradeço pela atenção e rogo a Deus que, independente do valor ofertado, multiplique as bênçãos e livramentos nas vidas daqueles que se se dispuserem a colaborar.

Parafraseando o apóstolo Paulo em Efésios 6:23-24, que a graça e a paz sejam conosco, todos os que amam a nosso Senhor Jesus Cristo em sinceridade, hoje e para todo o sempre!

ARQUIVOS
Subscribe
Notify of

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
plugins premium WordPress Optimized by Optimole