Um jovem cristão foi convidado por um amigo descrente para uma caçada.
Depois de haverem já atravessado banhados e abatidos um bom número de marrecos, o jovem resolveu falar ao companheiro sobre a sua fé:
— Sou frequentemente tentado e o diabo sempre de novo quer me levar ao pecado, de modo que preciso estar sempre vigilante.
— Mas — disse o descrente — como é que o diabo tenta você, que é cristão, e a mim, que sou incrédulo, ele me deixa desfrutar os prazeres da vida?
O jovem cristão achou difícil a pergunta, refletiu um pouco e então respondeu:
— Amigo, nessa caçada aprendi vendo como você não se preocupava em juntar logo os marrecos mortos, mas corria atrás dos vivos que tentavam escapar: da mesma forma, o diabo persegue quem ainda tem vida espiritual e tenta escapar de suas garras, mas deixa em paz os que, como você, já são marrecos mortos.
Embora essa pequena história seja relativamente conhecida no meio cristão, não costuma receber a atenção que merece.
Isso é lamentável porque, longe de ser a explicação de um problema, ela aponta para algo muito consolador e até mesmo estimulante para os que, de fato, confiam em Cristo e, em sua primeira carta, o apóstolo Pedro afirma algo que vai de encontro ao que é ensinado nesta história:
Sendo assim, humilhai-vos sob a poderosa mão de Deus, para que Ele vos exalte no tempo certo,
(1 Pedro 5:6-9 – KJA)
lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de vós!
Sede sensatos e vigilantes.
O Diabo, vosso inimigo, anda ao redor como leão, rugindo e procurando a quem devorar.
Resisti-lhe, permanecendo firmes na fé, conscientes de que os irmãos que tendes em todo o mundo estão atravessando os mesmos sofrimentos.
Pedro escreveu esta carta a vários irmãos na fé que estavam sofrendo todo tipo de perseguição na Diáspora — ou Dispersão, isto é, que estavam desterrados de suas pátrias devido à perseguição implacável do Império Romano aos cristãos — e ressaltou que tal perseguição e sofrimento vinha por imposição do diabo que, tal como um leão feroz, procurava a quem devorar.
Isso, na verdade, não é referência à morte física que muitos estavam sofrendo, mas sim à tentativa satânica de afastar os crentes de Cristo e, daí, o conselho para que permanecessem firmes na fé, sabendo que iguais sofrimentos estavam sendo impostos aos demais irmãos ao redor do mundo.
Tal coisa não acontecia aos chamados “apóstatas”, ou seja, àqueles que tinham uma “fé” entre aspas, apenas de nome.
No Império Romano, o culto aos deuses e ao Imperador era uma exigência: não eram feitas quaisquer ameaças àqueles que diziam não crer nas divindades romanas ou que o próprio imperador fosse divino, desde que o culto fosse prestado.
Em outras palavras: o culto não precisava ser sincero, mas, por força de lei, tinha de acontecer… ou severas penalidades eram impostas!
Dessa forma e visando preservar suas vidas, muitos dos que se declaravam cristãos optavam por racionalizar seu procedimento — usando a desculpa de que “o importante é o que está no coração” — e se sujeitavam à lei romana, prestando os cultos pagãos e imperiais exigidos, mas negando publicamente o seu Salvador.
Outros, embora não chegassem a prestar o culto em si, valiam-se de uma artimanha: subornavam os oficiais e, assim, compravam o documento que era dado aos que haviam cumprido a lei, livrando-se assim das penalidades, mas — por evitar a perseguição escondendo-se atrás de uma mentira — comprometendo totalmente seu testemunho.
Tertuliano de Cartago — um dos chamados “pais da igreja”, que viveu entre os séculos II e III e conheceu tal perseguição — condenava ambas as atitudes: prestar culto a deuses pagãos ou a um simples homem é algo que, no cristianismo, é totalmente inaceitável e, segundo suas próprias palavras, o ato de se portar um documento arranjado por suborno para revestir de sinceridade a uma mentira… tampouco era uma atitude cabível:
“Quando você finge honrar algo que você de fato não honra (só para se livrar ou ser aceito), você tira proveito das pessoas que pensam que você foi sincero.”
Essa perseguição contra os cristãos nunca chegou a cessar, ao menos não ao mesmo tempo em todo o mundo.
Quando, no século IV, o Império Romano foi “cristianizado”, inicialmente — com o fim da perseguição no reinado de Constantino e, posteriormente, com o cristianismo declarado religião oficial do estado nos tempos de Teodósio — o problema deixou de ser a perseguição física para se tornar a paganização: o ingresso de várias pessoas que apenas seguiam um modismo e nada sabiam a respeito do verdadeiro Evangelho acabou por infiltrar muitas doutrinas anticristãs no que deveria ser a cristandade.
A perseguição tornou-se velada, por meios filosóficos ou ideológicos que acusavam quem rejeitava as doutrinas pagãs de “intolerância” e “fanatismo”.
Não é mera coincidência se isso lembra o mundo de hoje: a perseguição física AINDA não acontece no Ocidente, porém a cada vez maior difusão do sentimento anticristão e com os mesmos rótulos sendo atribuídos aos cristãos de hoje… é de se esperar que não demore a começar.
Diante disso, é importante destacar que — tanto como na história dos marrecos quanto na passagem de 1 Pedro — o fato de um cristão ser perseguido (seja física ou ideologicamente) não é, ao contrário do que pode parecer, um problema, mas sim uma consolação!
Os inimigos de Deus só perseguem aqueles em quem há vida espiritual, aqueles que de fato demonstram ser cristãos e testemunham sua fé, pregando e vivendo o Evangelho de Cristo: os espiritualmente mortos já fazem parte de seus domínios e, por isso, longe de serem perseguidos, são enaltecidos e honrados.
É exatamente por isso que — enquanto os verdadeiros cristãos são discriminados, insultados e tratados como párias — vemos hoje muitos apóstatas e falsos crentes ganhando mais e mais espaço e elogios na mídia.
Charles Haddon Spurgeon descreve muito bem essa condição, quando afirma:
“Os cristãos não estão em perigo quando estão sendo odiados pelo mundo, mas sim, quando são admirados.”
O próprio Jesus, na véspera de sua crucificação, alertou os discípulos a respeito do que os esperava em um mundo hostil à sua Pessoa, Palavra e Obra:
Se fôsseis do mundo, ele vos amaria como se pertencêsseis a ele.
(João 15:19-21 – KJA)
Entretanto, não sois propriedade do mundo; mas Eu vos escolhi e vos libertei do mundo;
por essa razão, o mundo vos odeia.
Recordai-vos das palavras que Eu vos disse: ‘nenhum escravo é maior do que o seu senhor’.
Se me perseguiram, também vos perseguirão.
Se obedeceram à minha Palavra, igualmente obedecerão à vossa orientação.
Contudo, o mundo vos tratará mal por causa do meu Nome, pois eles não conhecem Aquele que me enviou.
Desse modo, tal como Jesus foi perseguido até a morte e perseverou — herdando o nome que está acima de todo nome (conforme Filipenses 2:9) —, a perseguição contra todos os cristãos verdadeiros deve ser, antes de uma preocupação, um consolo, pois revela que eles, como Jesus, não pertencem ao mundo.
Ainda que tal perseguição possa ser fonte de sofrimento e tristeza, nunca devemos esquecer que tudo isso é passageiro: mesmo que existam aflições, Jesus já venceu o mundo (veja João 16:33) e um dia a sua vitória final será compartilhada de forma plena com todos os que n’Ele confiam.
Nos Laços do Calvário
Eduardo Pydd Teixeira
Nascido na Porto Alegre de 1973, exerceu ministério pastoral na IELB — Igreja Evangélica Luterana do Brasil entre 1999 e 2008. Radicado em São Paulo desde o final de 2008.
Cada vez menos pessoas têm sido capazes de reconhecer seus pecados porque vivemos o tempo no qual muitas empresas eclesiásticas os acolhem e incentivam como se fossem ADIÁFOROS, porém isso é apenas mais um indício de que os tempos finais estão se configurando muito rapidamente e, antes que o Senhor volte como um ladrão na noite, é necessário que o profetizado reinado do anticristo se consolide não apenas no Brasil, mas por todo o mundo!
Na fase 2023 d’O Pior evangelho decidi lançar mão de novos formatos na expectativa auxiliar a aumentar o alcance dos conteúdos relacionados às Escrituras — stories, vídeos, textos mais curtos, autores convidados… — e essa publicação, onde tomei a liberdade de realizar revisão e ilustração, é parte desse projeto.
Obrigado por ter lido até aqui.
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